que se orgulha e estufa o peito
dizendo que odeia política.
Não sabe o imbecil
que da sua ignorância política
nascem o prostituta, o menor abandonado,
o assaltante e o pior de todos os bandidos,
que é o político vigarista, pilantra, corrupto
e lacaio das empresas nacionais e multinacionais".
*Mena Azevedo
Vive-se a pós-modernidade, época de grandes transformações que ocorreram em termos sociais, econômicos e científicos com o surgimento das máquinas.
Nesses tempos pós-modernos, o Brasil passou por avanços e retrocessos nas mais diversas áreas que afetam diretamente o homem. A educação foi sucateada durante a Ditadura Militar, quando as liberdades foram cerceadas nas instituições de ensino, os salários dos professores, aniquilados e as estruturas físicas das escolas, deterioradas. Restava aos educadores o simples e monótono papel de repassar conhecimentos envelhecidos e pré-determinados pelos órgãos superiores. Aos alunos, estudantes universitários ou do colegial, era-lhes negada a palavra para expor qualquer opinião ou debate de idéias. Até mesmo os discursos, por ocasião de festas cívicas ou formaturas passavam pela supervisão dos diretores das instituições. Esses eram pessoas nomeadas pelo governo e, para se conservarem nos cargos e manterem o seu “status quo”, viviam em completa subserviência aos “patrões”, homens que serviam à ditadura.
Mas como nada fica para sempre, esse estado de submissão e violência moral que tolhia a voz do povo, caiu por terra. Paulatinamente, os movimentos democráticos iam ganhando as ruas. De início, era uma voz tímida e sufocada na garganta, após viver mais de vinte anos no silêncio, com o golpe militar. Aos poucos, as vozes que se calaram por aquele “longo e tenebroso inverno”, explodiram nas ruas e avenidas das capitais e das grandes cidades e tomaram conta do país. E a política foi ocupando espaço maior nas discussões e bate-papos das pessoas das várias camadas sociais e faixas etárias.
Diz-se hoje que, nunca, no Brasil, discutiu-se tanto política e cidadania, como agora. Passado o jejum dos anos de privação da palavra, os brasileiros passaram a ingerir política no café da manhã, no almoço e no jantar. Um cardápio muitas vezes pesado, em contraponto ao jejum forçado no período de 1964 a 1985, imposto pelas armas e com o apoio de setores mais conservadores da sociedade, da imprensa e parte da igreja.
Foi um período de apreensão, tristeza e indignação em que a população brasileira mergulhou. Tudo era vigiado e cometiam-se as mais atrozes ações, em nome de uma “falsa segurança”.
Nas escolas, fecharam-se os Grêmios Estudantis e criaram-se os Centros Cívicos, controlados pelos diretores, pessoas de confiança dos governos ditatoriais. Calaram-se as vozes dos estudantes, dos artistas, dos escritores, dos poetas e de muitos jornalistas, dramaturgos e cineastas. Esses profissionais tiveram suas produções censuradas.
Caído o regime de opressão, o tema “política” volta aos bate-papos, às salas de aula, aos noticiários de rádio e tv, aos jornais escritos, às músicas, aos poemas, ao cinema e à dramaturgia. A política volta também à conversa de jovens e adultos, gente letrada e iletrada, homem da cidade e homem do campo. O fato é que há hoje uma consciência maior que grita pela liberdade de expressão, que quer escolher seus governantes e denunciá-los quando deixa de confiar neles. A mídia coloca ao alcance dos eleitores, sem medo de punição, as mazelas sociais deixadas pela inoperância, pelo descaso e pela corrupção. Ninguém aceita mais as falcatruas, o fisiologismo desrespeitoso e o nepotismo que envergonha as famílias.
Não obstante a volta das liberdades, vêem-se, ainda hoje, resquícios do regime militar engendrados na mente e na alma de políticos autoritários, verdadeiros déspotas que, para se conservarem no poder, se utilizam de meios desonestos, de prepotência e perseguições, apadrinhamentos e repartição de empregos a pessoas incapazes. Por isso, não se pode afirmar que se vive neste país uma real democracia. O regime é democrático, mas os políticos que aplaudiram a ditadura continuam com as mesmas idéias cristalizadas na suas mentes doentias. Vê-se isso materializado nas ações que praticam, nos conluios que fazem, na arrogância com que tratam seus subordinados.
Embora a liberdade tenha ressurgido como uma conquista das forças democráticas, há ainda muitos conflitos entre o que o homem comum pensa e o que o político estabelece como diretrizes de sua administração.
Sabe-se que a política é constitutiva do ser humano e prende-se ao seu caráter intrinsecamente social. Por que, então, muitas pessoas se dizem “apolíticas”? É de causar estranheza alguém declarar-se “apolítico”. Deve-se isso a quê? Alienação? Medo? Como o homem, um animal social, pode ficar dissociado da política? Não é ela parte integrante da sua sociabilidade, numa ação cruzada com a sua intersubjetividade? Existe também o outro lado que trata da relação do homem com a natureza e da relação homem-homem. Essa é uma relação insofismavelmente estabelecida, que se torna impossível ao homem sobreviver sem a política.
Essa reflexão dá conta de que a política não é algo ruim, feio, pecaminoso, sujo, mas alguns políticos é que a fizeram assim. Portanto, viver sem política é impossível. Ela é essencial à vida do ser humano, desde que suas ações sejam mediatizadas pela razão, desenroladas com autocontrole das emoções. Dessa forma , se produzirão atos conscientes e em respeito à coletividade.
Falar, então, que é “apolítico” distancia o homem da sua identidade social, porque é do homem que a política trata e é na sociedade que ele vive. Achar-se “apolítico” é, pois, um equívoco. É ter uma visão tacanha, unilateral e simplista de si mesmo e do outro, com juízo de valor concebido aleatoriamente de que política não presta e de todos os políticos são iguais. Inquestionavelmente, nenhum país, nenhum povo, nenhuma sociedade se estabelece sem política.
Viver alheio à política é uma atitude medíocre e preconceituosa do senso comum. Nenhum homem em sã consciência poderá eximir-se desse comportamento social e dessa realidade intrínseca das relações, surgidas desde a Antiguidade Clássica. Fora Tucídides o criador da história política. Ao visitar Atenas pela primeira vez, ficou atônito e se enraizou na vida da Atenas de Péricles que tinha a política como o pão nosso de cada dia. Não foi a história que se tornou política, mas o pensamento político é que se tornou histórico, segundo Werner Jaeger.
Pode-se perceber, portanto, que a política não se constrói da forma que um e outro quer, mas que ela se estabelece na sociedade como forma de melhorar o ser humano, deixá-lo mais aprimorado para viver bem consigo e com o outro. Para isso é preciso que as ações dos políticos sejam voltadas para o bem comum.
Este texto surgiu em virtude da minha inquietação de ouvir, nos últimos tempos, as pessoas se manifestarem como “apolíticas”, como prerrogativa dos seus desenganos.
*Mena Azevedo - Graduada em Letras, Pós-graduada em: Docência Superior; Administração de Sistemas Municipais de Ensino; Literatura Brasileira e Portuguesa; Membro efetivo da Academia de Letras e Artes de Brumado - ALAB, pela qual tem livro publicado: “Pelos Vieses da Educação” e poeta.
Recanto das Letras: http://recantodasletras.uol.com.br/autor.php?id=6834
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