Fotografo: J. LUÍS
O toque, o cheiro, o som e a intuição são as armas secretas das mães cegas na hora de cuidar dos filhos pequenos
A cegueira não impediu que 12 mulheres cearenses com deficiência visual realizassem o sonho da maternidade. Como toda mãe de primeira vez, elas tiveram que aprender a amamentar, dar banho e alimentar os bebês. Uma pesquisa inédita no Brasil, realizada no Ceará, revela que não só essas mulheres venceram as dificuldades da deficiência, como também conseguiram cuidar sozinhas dos seus filhos.
O estudo, em fase final de análise, é da professora e pesquisadora do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), enfermeira Márcia Maria Tavares Machado. “As mães foram identificadas em instituições que atendem pessoas cegas e, a partir da técnica de bola de neve, mulheres indicavam outras mães. Responderam ao questionário mães cegas com filhos de zero a dez anos de idade”, disse a pesquisadora da UFC.
Segundo ela, não existe informações oficiais sobre o quantitativo de mães cegas no Estado ou no Brasil e, até a literatura científica fala pouco sobre o assunto. O único dado que conseguiu levantar no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é que há 700 pessoas cegas residindo no Município de Fortaleza.
Para ter o perfil das mães cegas, seu dia-a-dia, a pesquisadora da UFC partiu do zero. Participaram da pesquisa 12 mães cegas, com idade média de 30 anos e escolaridade que variou entre o Ensino Fundamental e o nível superior. Sete eram casadas ou viviam com o companheiro.
A pesquisa mostrou que todas as mães cegas amamentaram seus filhos na enfermaria e em casa, após a alta. Metade dos partos foi normal e somente uma teve acompanhante no parto. A maioria entrou sozinha na sala de parto e quando o bebê nasceu foi levada para o berçário. “Os profissionais de saúde acham que as mães cegas não sabem cuidar do bebê e dificultam o acesso dos familiares. A pesquisa mostrou que somente 58,3% das gestantes tiveram acompanhantes na enfermaria”, criticou a professora Márcia Machado.
Com relação às práticas da amamentação, a pesquisa revelou que apenas 50% das mães receberam orientação sobre a técnica durante o parto. O estudo apontou ainda que algumas tiveram dificuldades para amamentar e receberam apoio de familiares e, especialmente, de vizinhos.
A partir do relato das mães cegas, que o pré-natal é geralmente realizado por médicos dos hospitais, onde houve o parto. Apenas duas fizeram o pré-natal na atenção básica. “Observamos que há um despreparo entre os profissionais de saúde em lidar com mães cegas. Essas mulheres necessitam de um suporte maior, desde a gravidez. Espero que essa realidade mude”, conclui.
SEM MEDO
Famílias driblam as dificuldades
Laura de Abreu Freitas, cega de nascença, foi mãe pela primeira vez aos 17 anos. Hoje, aos 25 anos, ela é mãe de Gabriel, de 8 anos e, de Vinícius, de um ano e oito meses. “No começo, tive muito medo, mas minha mãe me ajudou a cuidar do Gabriel nos primeiros 15 dias. Com o segundo, ela ficou somente até cair o umbigo”, relata.
Apesar da segunda gravidez, ela ainda tem dificuldades para ministrar os remédios quando está sozinha. “Quando o Gabriel está em casa, ele me ajuda. Se não tem ninguém, coloco o dedo no copinho do remédio e vou sentindo as gotas até chegar à dosagem do medicamento”, conta Lauras. Essa técnica de dar remédios aos filhos ela aprendeu na prática, mas diz que não serve quando é injeção. “Como o meu marido também é cego, prefiro os remédios em gotas”.
Hoje, ela tem mais problemas para dar banho no filho caçula e, desde o primogênito nunca sentiu dificuldades na hora de cozinhar. “Sempre gostei de cozinhar e para me ajudar nas tarefas em casa, tenho uma diarista”, salientou Laura. Para ela, a maior dificuldade das mães cegas é o preconceito da sociedade.
Contou que no início do casamento, o fato de morar com sua mãe, algumas pessoas achavam que a avó deveria cuidar do seu filho. “Minha mãe nunca concordou e respondia que eu é que tinha de cuidar, pois ela sempre me criou como se eu fosse normal”, frisou.
Para Socorro Campelo Bessa, 35 anos, não há mistérios em cuidar da filha Edvone Maria, de quatro anos. “Amamentei minha filha até dois meses atrás”, diz a mãe cega. Casada com Augusto de Sousa, também cego, ela já faz planos para ter outro filho e de voltar a trabalhar fora de casa.
SUCESSO
50% das mães cegas receberam orientação sobre amamentação durante o pré-natal
16,7% tiveram dificuldades para amamentar após a alta hospitalar
18,2% buscaram ajuda para resolver o problema
66,7% das mães cegas deram à luz a meninas normais
83,3% não trabalham
SUELEM CAMINHA
Repórter
*Laura de Abreu Freitas, de 25 anos, foi mãe pela primeira vez aos 17 anos. Hoje, ela cuida dos dois filhos Gabriel e Vinícius
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A cegueira não impediu que 12 mulheres cearenses com deficiência visual realizassem o sonho da maternidade. Como toda mãe de primeira vez, elas tiveram que aprender a amamentar, dar banho e alimentar os bebês. Uma pesquisa inédita no Brasil, realizada no Ceará, revela que não só essas mulheres venceram as dificuldades da deficiência, como também conseguiram cuidar sozinhas dos seus filhos.
O estudo, em fase final de análise, é da professora e pesquisadora do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), enfermeira Márcia Maria Tavares Machado. “As mães foram identificadas em instituições que atendem pessoas cegas e, a partir da técnica de bola de neve, mulheres indicavam outras mães. Responderam ao questionário mães cegas com filhos de zero a dez anos de idade”, disse a pesquisadora da UFC.
Segundo ela, não existe informações oficiais sobre o quantitativo de mães cegas no Estado ou no Brasil e, até a literatura científica fala pouco sobre o assunto. O único dado que conseguiu levantar no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é que há 700 pessoas cegas residindo no Município de Fortaleza.
Para ter o perfil das mães cegas, seu dia-a-dia, a pesquisadora da UFC partiu do zero. Participaram da pesquisa 12 mães cegas, com idade média de 30 anos e escolaridade que variou entre o Ensino Fundamental e o nível superior. Sete eram casadas ou viviam com o companheiro.
A pesquisa mostrou que todas as mães cegas amamentaram seus filhos na enfermaria e em casa, após a alta. Metade dos partos foi normal e somente uma teve acompanhante no parto. A maioria entrou sozinha na sala de parto e quando o bebê nasceu foi levada para o berçário. “Os profissionais de saúde acham que as mães cegas não sabem cuidar do bebê e dificultam o acesso dos familiares. A pesquisa mostrou que somente 58,3% das gestantes tiveram acompanhantes na enfermaria”, criticou a professora Márcia Machado.
Com relação às práticas da amamentação, a pesquisa revelou que apenas 50% das mães receberam orientação sobre a técnica durante o parto. O estudo apontou ainda que algumas tiveram dificuldades para amamentar e receberam apoio de familiares e, especialmente, de vizinhos.
A partir do relato das mães cegas, que o pré-natal é geralmente realizado por médicos dos hospitais, onde houve o parto. Apenas duas fizeram o pré-natal na atenção básica. “Observamos que há um despreparo entre os profissionais de saúde em lidar com mães cegas. Essas mulheres necessitam de um suporte maior, desde a gravidez. Espero que essa realidade mude”, conclui.
SEM MEDO
Famílias driblam as dificuldades
Laura de Abreu Freitas, cega de nascença, foi mãe pela primeira vez aos 17 anos. Hoje, aos 25 anos, ela é mãe de Gabriel, de 8 anos e, de Vinícius, de um ano e oito meses. “No começo, tive muito medo, mas minha mãe me ajudou a cuidar do Gabriel nos primeiros 15 dias. Com o segundo, ela ficou somente até cair o umbigo”, relata.
Apesar da segunda gravidez, ela ainda tem dificuldades para ministrar os remédios quando está sozinha. “Quando o Gabriel está em casa, ele me ajuda. Se não tem ninguém, coloco o dedo no copinho do remédio e vou sentindo as gotas até chegar à dosagem do medicamento”, conta Lauras. Essa técnica de dar remédios aos filhos ela aprendeu na prática, mas diz que não serve quando é injeção. “Como o meu marido também é cego, prefiro os remédios em gotas”.
Hoje, ela tem mais problemas para dar banho no filho caçula e, desde o primogênito nunca sentiu dificuldades na hora de cozinhar. “Sempre gostei de cozinhar e para me ajudar nas tarefas em casa, tenho uma diarista”, salientou Laura. Para ela, a maior dificuldade das mães cegas é o preconceito da sociedade.
Contou que no início do casamento, o fato de morar com sua mãe, algumas pessoas achavam que a avó deveria cuidar do seu filho. “Minha mãe nunca concordou e respondia que eu é que tinha de cuidar, pois ela sempre me criou como se eu fosse normal”, frisou.
Para Socorro Campelo Bessa, 35 anos, não há mistérios em cuidar da filha Edvone Maria, de quatro anos. “Amamentei minha filha até dois meses atrás”, diz a mãe cega. Casada com Augusto de Sousa, também cego, ela já faz planos para ter outro filho e de voltar a trabalhar fora de casa.
SUCESSO
50% das mães cegas receberam orientação sobre amamentação durante o pré-natal
16,7% tiveram dificuldades para amamentar após a alta hospitalar
18,2% buscaram ajuda para resolver o problema
66,7% das mães cegas deram à luz a meninas normais
83,3% não trabalham
SUELEM CAMINHA
Repórter
*Laura de Abreu Freitas, de 25 anos, foi mãe pela primeira vez aos 17 anos. Hoje, ela cuida dos dois filhos Gabriel e Vinícius
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